domingo, 1 de março de 2009

“eu-outro (espelho): dizeres sobre o eu”


autor: Yan Chaparro
obra: "estado de diluição (alívio-dor)"
tamanho: 70x60
ano: 2008


A carne de um outro é costurada, se costura na pele de quem fala (minha), o sangue de um e do outro, se misturam em meio de forças de desejo de estar, e de ambigüidades de fugir, o sangue se confunde nos rasgos delicados feitos pelo o pêlo que se intercala no estado irônico de prazer, em cada pulsão sugerida na possibilidade dos poros da minha epiderme. A dor é real.
O sarcasmo exibido pelo tempo nas linhas que contornam, dão forma e preenchem na brutalidade do instante do asfalto, também é costurada e se costura, na pasta frágil de cada ruga branca da sola dos meus pés, este coberto pela borracha do carro, e do meu sapato. Então na artimanha de sobreviver, o asfalto exige uma costura temporal, e no instante que faz um acerto com a borracha, a dribla, e passa sua linha áspera por cada poro da minha pele escondida, do meu pé quase falso.
Uma costura se forma, exibindo na sua composição poética, a narrativa de algo que envolve, e é envolvido pelo que esta envolta, e na precisão contorcida (quando tenta suspirar, ou enganar que está vivo), como movimento desintegrado (entrelace de dor, prazer, imprecisão e risos), tece um diálogo delicado, denso pelo estado de viver, e aquilo que envolve o que esta envolvido, é mantido (em movimento) como figura que escorre ao outro, de outro a um, então fica tudo imbricado em uma mesma composição de substâncias que se diferem, se encontram, trocam, e se modificam. Quando o corpo exibe o seu passo no mundo, ele já é este mundo também.
O eu são estalos sussurrantes que na medida que fala de um outro, reconhece que este outro é ele mesmo, talvez com uma cara diferente, mas a necessidade de identificação projetiva com este outro, já exibe explicitamente que este outro falado pelo eu (sua posição no mundo), é muito, ou quase todo o eu. Quando este eu se coloca à pensar o ambiente e a paisagem urbana em que vive. O sangue é o elemento conflitante para poder compreender onde esta o limite do que é fantasia e realidade. Cada substância vermelha que sai do outro, do eu, é o vomito amargo de morte e vida, como sugestão de que algo acontece, simplesmente acontece. Penso como sinceridade duvidosa, que a barreira da fantasia e do real, é insistente, pois é estado de movimento, de diálogo, de encontro, como a percepção traumática e de alivio quando eu me encontro em movimento no mundo (de sangue, suor, idéias, apelos e risos), e observo que meu caminhar junto ao outro (eu mesmo – ele) acontece no instante do entre (fantasia – real), um entre confuso, sem precisão, que caminha na sua solida desconstrução.
O entre que falo, que é postura de idéias do eu quando olha o outro em estado de sangue e pasta no chão. É um entre de contorções de sentidos, de idéias, de percepções e de paixões. Entre que é um lugar, estado de movimento, lugar parecido quando o eu percebe a relação - outro, sua relação - mundo, e sua idéia de fantasia – real. Então o entre é este lugar existente no diálogo, movimento de se perceber juto ao outro, sendo este também.
O eu aqui é um alguém comum, que ao perceber o outro (no instante de loucura), compreende que sua percepção acontece por reconhecer neste outro o eu também. E assim observa feliz e infeliz que seu corpo (o todo carne-alma), não se separa do mundo, também é este mundo, e que o interno não é tão interno, e o externo não é tão externo.
Fica o eu, o outro, o espelho, e a idéia de saber do outro quando lembro do espelho que não sai da minha frente. E uma outra coisa fica, fica a necessidade de falar sobre a violência, não uma violência que esta no sangue que escorre da boca amarga de quem apanha, mas uma violência delicada que traz para sua poética de caminhar ao e no cotidiano, o semblante pálido, de ausência, cisão com o próprio corpo, e conseqüentemente com o que o envolve.
O eu ao se deparam com o outro, recebe tapa bem dado, cai lagrima, mas sabe que esta vivo. E agora este eu se incomoda e grita para os outros corpos, que parecem zumbis, corpos que vestem de gravatas, saias, camisetas, sapatos e sandálias, mas que faz do seu caminhar o não sentido do próprio corpo e do outro, construindo do cotidiano, a precariedade do banal, rarefeito indigesto, que faz da ausência de si ao e com o outro, a violência cotidiana.
E ao pensar sobre esta violência, o eu, lembra de um passado, e o riso é espantoso para si, o incomoda. Riso que é seguido de um pensamento particular, existente no tesão de ter solucionado um problema. O eu pensa o seguinte “que é por causa desta violência de linhas e conteúdos pálidos, de cisão com o eu-outro, que o gato foi assassinado, quem estava no carro não se via (seu sangue), então não podia ver o outro, e talvez por isso que o gato se matou, por não agüentar mais ver muitos de si (outro), sendo mortos por causa da ausência, de gritos escondidos”.



(Yan Leite Chaparro, 27.02.2009)

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